A Saúde Mental e as Cidades
No âmbito do no WebIGAP promovido pelo IGAP, intitulado “Cidade e Território Na e Pós Pandemia”, onde a Hall Paxis participou enquanto assistente no debate e reflexão, partilhamos hoje o resumo da intervenção do Professor Júlio Machado Vaz, reconhecido psiquiatra, que aborda a saúde mental no contexto da cidade, quiçá o local onde a vida das pessoas foi mais atingida.
Urbanismo, educação e economia,
estes são os três vectores que deverão ser considerados e interligados, para
que possam ser dadas e adequadas as respostas necessárias – e mais eficientes –
no que às questões de saúde comunitária, diz respeito. Uma premissa que, Júlio Machado Vaz,
Psiquiatra, considera que “não deverá ser deixada apenas nas mãos dos
profissionais de saúde, uma vez que a sua complexidade abarca, sem dúvida, as
primeiras três vertentes”.
Na óptica do psiquiatra, “viver a
cidade é cada vez mais importante”, desfrutar dela e senti-la, o que considera
ser “completamente diferente de viver nela. O viver, implica, por um lado,
vivê-la [à cidade], mas está igualmente ligado aos problemas psicológicos de lá
se residir. Neste ponto, “a presente crise pode ser uma oportunidade para se diminuir
a distância entre os dois conceitos, tornando as cidades mais amigas de quem
nelas habita, através de uma nova filosofia e dinâmica”.
Intrinsecamente associados ao
modo de vida nas cidades, estão problemas de saúde como o stress, a
hipertensão, a obesidade (20%), questões psicológicas como a ansiedade (21%),
depressão (20%) e surtos psicóticos, doenças oncológicas e doenças
respiratórias obstrutivas crónicas. Aspectos que Júlio Machado Vaz leva em
linha com fatores como “o desordenamento das cidades, a poluição atmosférica, a
poluição sonora e a reconhecida falta de espaços verdes. No século XIX existiu
uma tendência que ligava o urbanismo e a medicina”, recorda o psiquiatra, “que
foi parcialmente abandonada no século XX, por força do betão e da massificação
dos edifícios, tendo a dimensão preventiva da saúde sido relegada para segundo
plano”, afirma.
Actualmente, em Portugal, a
referência é Siza Vieira, “adepto das cidades saudáveis e que defende uma linha
de continuidade da cidade no campo”. Linha essa, “condutora e homogénea”, no urbanismo
e no conceito subjacente.
Para JMV, esta será, “talvez,
altura de dar forma a esse modelo saudável de viver na cidade, evitando o
crescimento de desigualdades sociais que se acentuaram” em contexto de
pandemia.
A céu aberto, expostas à maioria, ficaram as dificuldades, quer ao nível das
“deficiências habitacionais e sociais, como no “agravamento do fosso entre
poder económico e os poucos recursos financeiros das famílias. As habitações
sobrelotadas onde um só espaço passou a ser escola, escritório, empresa,
ginásio, atelier… com todas as vicissitudes daí decorrentes, para a organização
e vivencia familiar”.
Este aspecto remete-nos, também,
para a problemática do mercado de arrendamento, considerado por Júlio Machado
Vaz, “muito fechado e difícil, por força da fraca oferta e dos preços exorbitantemente
praticados”. O psiquiatra atenta ainda num outro aspecto, não menos importante,
o perigo decorrente da “coabitação e a partilha entre colegas ou amigos,
durante a pandemia” o que “obrigou inúmeros jovens a regressar a cada dos
pais”. Decisão, também ela, associada a despedimentos, lay-off, condições
económicas precárias e subida do desemprego nas faixas etárias mais jovens,
entre os 20 e os 35 anos.
Júlio Machado Vaz é pragmático,
“se queremos cidades saudáveis, com pessoas saudáveis e capazes de responder
aos gigantescos desafios de uma pandemia, então o paradigma tem que se alterar.
O centro das cidades tem que ser habitado, tem que ter vida própria, têm que
existir jovens, tem que ter espírito comunitário e de tertúlia. É essa vida, a
participação activa e a inovação trazida pelos jovens, através das ideias
transformadoras da sociedade, que tornará as cidades sustentáveis, saudáveis e
um lugar apetecível para se viver. Não se olhe apenas às áreas metropolitanas,
povoadas por grandes edifícios que crescem como cogumelos, mas olhe-se para
dentro também”, para os centros.
Como nota final, e apelando à
reflexão, o psiquiatra remata com um apelo, “atente-se em dois artigos, um no
jornal Público, onde o Frei Bento Domingues fala das Desigualdades Sociais
Criminosas e outro no Expresso denominado “As cidades 15 minutos”.
Artigo jornal Público:
https://www.publico.pt/2020/12/06/opiniao/noticia/urgente-possivel-mudar-1941755
Artigo jornal Expresso:
Texto: Maria Helena Palma/Rita Palma Nascimento
Foto: Tiago Gomes
Sem comentários:
Enviar um comentário