segunda-feira, 24 de abril de 2023

Alentejo ...porque o horizonte é infinito ... Entrevista Kaihan Hamidi

 

Kaihan Hamidi, nascido em 1982, é um refugiado Afegão  a viver em Portugal com a família há cerca de dois anos.

Depois de uma passagem pela zona de Lisboa, Kaihan vive agora em Beja, onde ele e a esposa trabalham, e onde os filhos frequentam a escola.

A sua alma chama pela pintura e a maior parte dos seus tempos livres são ocupados entre lápis, pincéis, aguarelas e telas.

Não é fácil para um cidadão Afegão ir para outro país com a família, e aí encontrar uma forma de viver e de estar diferentes, uma cultura diferente e uma sociedade também ela diferente.

Quais foram os seus primeiros pensamentos e emoções?


Nós somos diferentes, cada um dos membros da família é diferente, reage e sente de forma diferente. A mudança para Portugal tem sido mais difícil para a minha esposa do que para mim, porque temos formas de estar e olhar o mundo diferentes. Para mim, Portugal, não é muito diferente daquilo que imaginei. É acolhedor, as pessoas são como as nossas pessoas, no Afeganistão e, por isso, tem sido fácil a minha adaptação. Para os meus filhos foi mais difícil inicialmente, contudo, e em especial para o meu filho mais velho, está a ser muito fácil agora, até mesmo com a língua. Está integrado na escola, tem amigos e pratica judo. Para a mais nova, embora o português já não seja uma barreira acentuada, existe ainda alguma dificuldade de integração.  

Eu venho de uma realidade difícil, que se alterou abruptamente com o a tomada de Cabul pelos Talibã. A liberdade condicionada, a cultura restrita, a forma de estar desconfiada e tímida. Portugal é o oposto disso. Aqui é tudo mais fácil.

 

Certamente não foi fácil para si encontrar uma nova casa, um novo trabalho, novos amigos, nova vida. A linguagem também é uma barreira. Neste momento podemos dizer que o Kaihan está mais ou menos integrado em Beja, tal como a sua família. Quer falar-nos um pouco desta sua experiência?

A língua é muito difícil para mim, bem mais do que para os meus filhos. Não consigo aprender, talvez porque também não tenha aulas e tente aprender sozinho. Contudo, torna-se fácil a comunicação em inglês, pois é raro não nos conseguirmos fazer entender. No meu trabalho, por exemplo, todos falam inglês, até porque são várias as nacionalidades a trabalhar ali. Não é bom para mim, no sentido em que não consigo aprender o português no trabalho, o que poderia ser uma oportunidade. Mas a língua deixa de ser uma barreira a partir do momento que o inglês é global.

 

A sua grande paixão é a pintura. É autor de quadros de grande qualidade que divulga nas redes sociais. Certamente que a pintura é sua aliada no encontro de um novo caminho. As suas pinturas sobre o castelo de Beja ou outros monumentos, são tão precisas, que têm o poder de nos impressionar profundamente.

Quando começa um trabalho, sabe exactamente em que direcção vai, ou a inspiração acontece no momento? Pode falar-nos um pouco sobre o processo criativo e a sua colocação em prática?


Sobre a aguarela, quando inicio um trabalho, sei exatamente aquilo que vou e quero pintar. É tudo muito claro para mim, o que eu imagino, traduzo para a aguarela.

Tal como um fotógrafo, um pintor precisa de ir aos sítios , aos locais, ver com os próprios olhos e capturar interiormente o que vê e sente. Em Portugal, pela proximidade e liberdade que existe, tenho a oportunidade de visitar locais diferentes e de poder pintá-los. Quando isso acontece, é sempre claro, para mim, aquilo que quero representar.

Por exemplo, relativamente ao Castelo de Beja, eu trabalho muito sobre ele. Encantei-me nele desde logo. Por ser um local histórico, faço o exercício de imaginar o que poderia ter sido a vida em torno daquele monumento noutra era. Crio a história na minha mente e passo-a para a tela.
Sobre o Museu, que é um lugar muito especial, o primeiro pensamento que me ocorre é sempre sobre Mariana Alcoforado, a janela de Mariana. Sei a história, é importante saber a história dos monumentos. Os lugares conversam connosco, todos os lugares têm alguma coisa para nos dizer e ensinar.

Mas voltando à aguarela, é a técnica que considero melhor representar e preservar os locais históricos, a que faz mais sentido no presente, porque nos transporta a nós e a esses locais  para um lugar comum. Exemplo disso são os camelos que frequentemente utilizo como elemento de ligação entre o passado e o presente nas representações do Afeganistão. Sobre Beja é idêntico, é a Beja Antiga que habita o meu imaginário artístico.

 

Existem muitas pessoas em Beja e noutros locais que já conhecem o seu trabalho. Já fez alguma exposição desde que chegou ou tenciona fazer?

Quando eu cheguei a Portugal, no primeiro mês, eu pensei que seria fácil conseguir uma exposição minha. Especialmente em Lisboa. Depois comecei a perceber a enorme dificuldade que existe em torno disso. Era claro para mim que iria conseguir uma exposição rapidamente, mas, até hoje, ainda não aconteceu.
Estou consciente da qualidade do meu trabalho e dado o meu percurso no Afeganistão, onde era um artista conceituado e professor na minha academia de arte, com mais de uma centena de alunos, pensei que Portugal me permitiria, com alguma facilidade, continuar esse percurso. O meu povo espera isso de mim, também. Enquanto referência para eles, sinto essa obrigação e desejo. Quero honrar o Afeganistão e quero que eles possam olhar para mim como alguém que teve a coragem de sair do país, de procurar um futuro melhor e ser bem sucedido no seu trabalho.
Foram muitos os artistas que abandonaram o país, uns estão em França, outros na Alemanha, no Canadá, na Bélgica… e a maioria está a conseguir expor as suas obras. Eu serei dos poucos que ainda não teve essa oportunidade, embora possa estar para breve.
Estive num campo de refugiados no Qatar antes de vir para Portugal e nesse campo consegui expor. Aqui é tão difícil… e é tão importante para mim.


É difícil para um refugiado Afegão dar a conhecer o seu trabalho em Portugal e vender os quadros?


Quando decidi vir para Portugal, pensei que era muito fácil. Depois de ter estado em Lisboa algum tempo, percebi que não seria tão fácil assim e que o país não era assim tão bom como imaginara, para os artistas plásticos. Entretanto vim para Beja e ao fim de algum tempo, as coisas começaram a correr melhor. Direi que não é muito bom, mas que é bom. É importante darmos o melhor de nós e do nosso trabalho às pessoas, para que elas o possam reconhecer. Sei a qualidade do meu trabalho, sei o que faço, e portanto, dou sempre o melhor. Comparando com a altura em que  comecei no Afeganistão, numa situação extremamente difícil e com muitos estudantes, o que aconteceu foi quase inacreditável, pois vendi uma grande parte de todos os meus trabalhos. Contudo, ao pensar nos dois países, para mim, é mais fácil trabalhar em Portugal, pois aqui as pessoas valorizam e reconhecem o nosso trabalho,  e gastam dinheiro para o adquirir, enquanto no Afeganistão a pintura vem num patamar de fim de linha. As pessoas apenas compram pintura, quando já têm tudo, até mesmo as classes mais abastadas. De qualquer forma, não consigo ainda viver só da pintura e sustentar a minha família, pelo que tive que arranjar um outro emprego a tempo inteiro numa empresa próximo de Beja.


O que pensa da cultura em Portugal e em Beja?

Em Portugal, cultura é sobre liberdade. Existe uma tendência para a cultura que se inicia em criança e que perdura ao longo do tempo. Música, dança, são expressões livres entre pais e filhos, entre amigos e grupos de pessoas. No Afeganistão não é possível cantar ou dançar em público e muitas vezes, mesmo no seio da própria família. Em Beja, por exemplo, os grupos de amigos juntam-se, cantam normalmente, convivem noite dentro,  e essa forma de estar é também cultura e é muito interessante.

 

Dizemos com frequência que o Alentejo tem um horizonte infinito. Concorda?

Concordo. Ao olharmos em volta parece que nunca acaba. Eu venho de um país e de uma zona com imensas montanhas, muito bonitas, mas que nos limitam o olhar. Aqui, vê-se sempre mais além e o pôr-do-sol é imenso.

 

Agradecemos-lhe bastante a disponibilidade e desejamos que o Alentejo vos traga tudo aquilo com que sonharam e que esse horizonte sem fim seja também a vossa visão para a vida.




segunda-feira, 17 de abril de 2023

Alentejo ... porque o horizonte é infinito ... Entrevista Diogo Nascimento

 

Podemos dizer que o Diogo Nascimento é um apaixonado filho da terra e do território. engenheiro de formação, tem profundo conhecimento da região do Baixo Alentejo, muito pela sua longa ligação à Edia, mas também pela sua actividade de perito avaliador e empresário.

Considera que, no Alentejo, o horizonte é infinito?

Em primeiro lugar, deixe-me agradecer o convite e felicitar a hall magazine, assim como a Hall Paxis pelo trabalho que tem desenvolvido na nossa região nos últimos anos.

Sim, sou um filho da terra preocupado e atento ao desenvolvimento da nossa região. Não me sinto um empresário, porque um empresário arrisca e toma a liderança em muitos projetos, e isso eu não tenho feito. Considero-me um técnico, com uma vasta experiência na gestão pública, que tem tido o privilégio de trabalhar no principal projeto de desenvolvimento territorial que a minha geração presenciou. O projeto de Alqueva, no qual estou envolvido faz este ano 25 anos, tem sido uma experiência profissional e um desafio que marcou a minha carreira. Quando regressei a Beja, depois de estudar e de começar a trabalhar noutros locais, tive a oportunidade de ingressar na EDIA, que tem sido uma empresa de referência e que muito tem contribuído para o Alentejo, e mais concretamente, para Beja. Simultaneamente, desenvolvo uma atividade de avaliador imobiliário, fruto da necessidade que tive em aprofundar conhecimentos e alargar a minha atividade profissional ao longo dos anos.

Igualmente, a minha preocupação, tem levado a que me tenha envolvido, de forma voluntária, em várias áreas da sociedade, trabalhando principalmente na área desportiva, onde exerço atualmente funções de vice-presidente da Associação de Futebol de Beja e na área social, com funções nos órgãos sociais de duas IPSS que trabalham afincadamente na nossa cidade e no nosso distrito.

Respondendo à sua pergunta, realmente o Alentejo é uma das regiões do país e da Europa com maior potencial de desenvolvimento, com uma diversidade única, e que quando pensamos e sonhamos podemos entrar naquilo que é o infinito de oportunidades e soluções que são colocadas à nossa frente. Assim, sim, o Alentejo, dadas as suas características, sociais, humanas, territoriais, paisagísticas, …. É infinito!

 

Na sua opinião, as lacunas existentes relacionam-se, essencialmente, com que factores?

Lacunas existem sempre, mesmo nos locais e economias mais desenvolvidas. Na minha opinião, o nosso principal problema tem a ver com a questão demográfica.

Nos últimos 70 anos, na generalidade, o Alentejo tem perdido população, à exceção de um ou outro concelho que devido a um ou outro projeto concreto tem provocado o efeito contrário, o que tem conduzido a falta de capacidade para resolver e conseguir colmatar alguns problemas com que a região se tem debatido.

A falta de capacidade para a fixação da população, associada à inexistência de políticas públicas eficazes, abrangentes, mas que permitam a diferenciação, torna a região mais vulnerável quando comparada a outras regiões do país.

Não percebo porque é que os vários governos, e são vários nos últimos 40 anos, não assumem de forma inequívoca e clara, que uma das principais missões que o país tem é conseguir fixar a população no interior, apostando em programas com envelopes financeiros com orçamentos significativos, para permitirem que as medidas sejam eficazes. Ouvimos muitos discursos, e frases feitas, mas medidas concretas e diferenciadoras, que permitam a fixação da população, de quadros técnicos especializados e outros, e respetivas famílias, não vemos que tenham tido eficácia.

Beja é um exemplo disso. Com o projeto de Alqueva, vemos a criação de novas empresas, de empresas sediadas noutros locais, mas que os seus quadros não se fixam na região. Trabalham cá, pernoitam em Beja durante a semana, mas não decidem vir para cá morar. Temos que ser capazes de tornar o nosso território atrativo, para além de trabalhar, mas para viver….. Se formos capazes de o fazer, então muitos dos problemas com que nos deparamos serão resolvidos. Uns devido ao aumento populacional, outros devido às dinâmicas de mercado que, entretanto, se vão criando.

São situações e questões que me preocupam, na qualidade de bejense, que decidiu continuar em Beja, que é casado e tem três filhos. Que futuro queremos para os nossos filhos e netos? É uma questão que me coloco muitas vezes….

 

São as mentalidades determinantes para a mudança de paradigma? Conseguimos trabalhá-las? De que forma?

Completamente. Ao nível profissional, devemos olhar para a concorrência não como inimiga, mas como parceira. No território em que somos muito poucos, teremos todos a ganhar se trabalharmos de forma organizada, ganhando efeito de escala, e com isto potenciando os setores mais competitivos e diferenciadores que temos.

Ao nível mais humano e individual penso que há muito a fazer. Trabalhando ao nível dos diversos escalões etários, e sem querer alterar a nossa identidade e personalidade, devemos encarar a nossa nova realidade, resultante da globalização, como uma oportunidade.

Dou este exemplo. Se queremos, ou achamos que devemos ter uma sociedade mais participativa e colaborativa, então temos que ser capazes de induzir esta forma de estar nas nossas gerações mais jovens. Ainda recentemente, vi uma notícia, que uma percentagem muito significativa de jovens discute política…. É um ótimo sinal! Vejo que os jovens estão mais abertos a discutir os problemas e a não ficarem indiferentes relativamente ao que os rodeia. Mas se queremos que os mesmos se envolvam de forma comprometida, temos que desde cedo, na escola, diferenciar esses mesmos jovens que dedicam algum tempo a trabalho social, cultural, voluntariado, e outras atividades em prol da sociedade. Esses jovens deveriam ver o seu aproveitamento escolar majorado de alguma forma, quando comparados com outros que estão indiferentes…. Se perguntar a um professor, se calhar vai-nos dizer que não concorda nada, mas penso que é o caminho.

Igualmente, quem se dedica a uma causa, integrando órgãos sociais de determinadas entidades e setores, voluntariamente, também teria que ter algum benefício, como, por exemplo, o aumento de anos para contagem da reforma…. Desta forma, talvez conseguíssemos fazer com que as instituições que desempenham papeis fundamentais em muitas áreas da nossa sociedade, substituindo-se ao papel do Estado, fossem mais ativas e despertassem mais interesse às pessoas.

 

Assistimos, nos últimos anos, a uma transformação profunda em termos paisagísticos e económicos, desencadeando as inevitáveis alterações no tecido social.

Como caracteriza cada um destes aspectos e que correcções sugere que possam ser feitas, hierarquicamente, de cima para baixo, ou seja, do poder central, para o poder regional e cidadãos?

O desenvolvimento económico também traz questões e aspetos que necessitam de correções e acompanhamento. Não podemos reivindicar que queremos uma região mais desenvolvida e esperar que nada aconteça ao nível social e paisagístico, quando esse desenvolvimento passa também pela alteração da paisagem.

Mas penso que não devemos olhar apenas para a árvore, mas para a floresta no seu todo.

Ao nível da paisagem, se tivermos planos de ordenamento que estejam adaptados, atualizados e que permitam a adaptação do território de forma ágil e sustentada, tudo será mais fácil. Na realidade não é assim que as coisas se têm desenvolvido, e depois somos confrontados com algumas situações em que nada é respeitado. Por outro lado, o Estado tem que ter capacidade de fiscalizar e sensibilizar os vários agentes, o que, a meu ver, não tem sido feito de forma eficaz e regular. Se não tivermos um Estado com capacidade reguladora e fiscalizadora, cairemos numa situação em que as lacunas se tornam normais e rotineiras. O que não é nada bom.

A questão social, considero que é o maior desafio que a nossa região atravessa, e muito particularmente, Beja. Além do desafio da fixação da população, como referi atrás, os fluxos migratórios que temos assistido nos últimos anos na nossa região obrigam a serem criadas capacidades de resposta, tanto para situações urgentes, como para situações que tenham como objetivo a integração total dos residentes temporários que se estabelecem no nosso território.

Igualmente, teremos de ser capazes de continuar a dar apoio às situações de desigualdade social que já existiam e que continuam a existir, que vão desde o acompanhamento a pessoas idosas que vivem sozinhas e isoladas, como a pessoas com problemas ao nível psíquico e de saúde.

As responsabilidades são de todos aos vários níveis. Ao nível central há a obrigatoriedade de criar programas de apoio concretos que permitam dotar as instituições que estão no terreno de meios humanos e materiais, por forma a exercer o seu trabalho da melhor forma e o mais próximo possível das pessoas. Ao nível local, os municípios têm um papel fundamental. Pelo conhecimento mais próximo que têm, e que poderão ter, das várias situações, por forma a classificar o que é mais urgente e necessário, como pela capacidade operacional que serão obrigados a implementar, agora, com a descentralização de competências ao nível social.

Mas, na minha opinião, o grande desafio que os municípios têm para os próximos anos, até final de 2026, será a implementação a estratégia local de habitação (ELH). A ELH consiste num envelope financeiro, no âmbito do PRR, que apoiará a construção de novas habitações e a reabilitação de habitações existentes, com vista à melhoria do parque habitacional existente.

Só disponibilizando habitação condigna conseguiremos minimizar desequilíbrios sociais existentes, criando critérios claros e rigorosos para a atribuição dessa habitação, exigindo o respetivo retorno por parte da sociedade.

Aqui, há trabalho a fazer em Beja, que, na minha opinião, ainda não conseguiu ter a dinâmica necessária para cumprir o compromisso assumido, correndo o risco de chegarmos ao final de 2026 e perder-se esta oportunidade.

 

 Cumpre, o território, a sua missão de agregação de populações, de fusão, de complementaridade?

É uma pergunta difícil de responder, e que a resposta seja apenas num sentido. Em muitos aspetos sim, mas existem outros que infelizmente ainda não foi capaz de o fazer.

Se olharmos para o Alentejo, e tendo presente as suas caraterísticas, dimensão, dispersão populacional, distâncias entre povoações, e quando vemos cada vez mais dificuldade das populações em dispor dos serviços públicos essenciais de proximidade, então o território não cumpre a sua missão de agregação e de fusão.

A realidade e disparidade entre cidades, vilas e aldeias é muito acentuada na nossa região.

Como queremos captar as novas gerações, os novos profissionais, os nómadas digitais (que estão muito na moda), se não temos para oferecer os serviços públicos básicos de proximidade. Claro que é um custo, mas é um custo que o Estado tem que assumir e interiorizar nos vários orçamentos, sejam eles mais à direita ou mais à esquerda. Não se trata de ideologia política, mas de desenvolvimento do território.

Espanha e França, apesar das inúmeras diferenças e problemas que têm, têm conseguido minimizar esta questão, onde vemos a existência de cidades de média dimensão e vilas mais apetrechas que as nossas.

Mas ao mesmo tempo, temos bons exemplos de agregação e fusão. Talvez o mais recente, na minha opinião, prende-se com o cante alentejano. Sempre existiu e foi cantado em muitos lugares, mas em poucos anos tornou-se uma marca transversal ao território, com algumas nuances, e que conseguiu mostrar um território uno e a falar a uma só voz.

 

Como vê a região no médio prazo?

A médio prazo, vejo que teremos um Alentejo e, especialmente, um Baixo Alentejo diferente, com capacidade para que algumas destas transformações se consolidem e contribuam para um território melhor. Claro que o contributo de determinados projetos será fundamental, tais como o alargamento do porto de Sines, as explorações mineiras, a consolidação e evolução tecnológica do regadio de Alqueva, entre outros, para a fixação de pessoas, especializadas e que tragam mais massa critica ao território. Mas será fundamental, a meu ver, a conclusão de duas obras fundamentais: a A26, com ligação à fronteira e não apenas a Beja e a eletrificação da linha férrea com ligação a Lisboa, diminuindo o tempo de viagem. São as duas infraestruturas decisivas para que dentro de 20 anos tenhamos uma região melhor! É o que espero!

 


 

 

segunda-feira, 10 de abril de 2023

Alentejo ... porque o horizonte é infinito ...Entrevista Evaristo Amaro

 

Evaristo Amaro tem um vasto currículo de actividades, às quais sempre dedicou grande profissionalismo e foco. Depois de ter passado pela área comercial e da respectiva gestão, mantém ligação à área de bem estar e abraçou as leis há cerca de 13 anos. Qual foi a motivação para este virar de página na sua vida profissional?

Não foi bem um virar de página, mas sim, mais uma página a acrescentar a outras já escritas. Desde sempre, que me conheci com um sentido de Estado, e um gosto especial pelo emaranhado de Leis, que forma o nosso ordenamento jurídico. O apelo pela área Jurídica, não foi o concretizar de um sonho, como acontece com várias pessoas, mas sim, de uma necessidade de preenchimento, de construção de uma personalidade, que sabia ser este o caminho a seguir. Depois de percorrer caminhos académicos na área da Psicologia, e da Administração de Empresas, da Formação, e da Segurança no Trabalho, foi a Solicitadoria, que preencheu um espaço em aberto, enveredando por esta Profissão, de que muito me orgulho, e que me disponho a dignificar.

 

Não raramente lhe chegam clientes com processos complicadíssimos e das mais variadas índoles. Nos processos de heranças, por exemplo, que conselhos dá a quem o procura acerca da regularização do património?

Os Processos que abordam as Sucessões, são sempre de uma maior complexidade, pois ao mesmo tempo, que vamos atuar na área do Direito Patrimonial, em relação à gestão processual, temos em simultâneo, que saber gerir emoções, muito próprias de quem perdeu um familiar. Existem dois tipos de clientes, que procuram um/a Solicitador/a que os ajude nas questões de Heranças, o cliente que não tem conflitos com os outros Herdeiros, e o cliente que tem conflitos, que pensam ser insanáveis. São estes que se tornam mais difíceis de gerir, mas que por vezes até se tornam mais fáceis, pois as partes desconhecem a legislação a aplicar, e as suas vertentes e soluções, as quais nos prontificamos a esclarecer, a maior parte das vezes, com resultados positivos. Depois de questionar as pretensões dos clientes quanto ao destino a dar aos bens móveis e imóveis, é feito um aconselhamento e gestão Processual, aplicado a cada caso, que entre outras soluções, pode culminar em Partilhas, ou na alienação do património, colocando os imóveis no mercado de venda, efetuando a legalização documental dos mesmos. O Trabalho do Solicitador, passa também por efetuar a gestão documental, para elaboração da Habilitação de Herdeiros e na Participação do Imposto de Selo sobre as Transmissões Gratuitas.

 

 Ainda na parte do património imobiliário, quer explicar-nos um pouco a importância de os documentos estarem em conformidade, relativamente a titulares, áreas, usufrutos, etc?

Para uma área como a do Património Imobiliário, que está em constante mutação, com um movimento de vários milhões de euros/dia em Portugal, com uma legislação muito variada, e dispersa por vários Diplomas, é crucial que a legalidade dos Documentos que instruem os Processos esteja em conformidade com o que a Lei exige. A título de exemplo, a Lei exige que um imóvel, para ser alienado, o titular tem que ser detentor desse direito, estando inscrito na Certidão Permanente Predial, no entanto é permitido que o detentor do direito possa alienar, sem ser o titular inscrito, com documentos instrutórios como Habilitação de Herdeiros, Testamento, actos no próprio dia, entre outros.

A uniformização das áreas, na Caderneta Predial e na Certidão Permanente, é outra das premissas necessárias para a transmissão do imóvel, podendo ser corrigidas nos termos da Lei.

No que toca ao usufruto, é esta uma figura jurídica cada vez mais utilizada, principalmente na alienação por Doação, transmissão da titularidade em vida, em que o Doador reserva para si o Usufruto e doa a Nua Propriedade, o que se verifica essencialmente na transmissão do imóvel, entre pais e filhos.

Numa Gestão processual, além dos supra referidos, incluem-se outros documentos instrutórios, cuja conformidade é necessária para uma compra e venda de imóvel urbano, tais como Procurações, quando aplicável, a Licença de Utilização/habitabilidade, ou a sua isenção, a Ficha Técnica de Habitação, quando aplicável, a Certificação energética, quando aplicável, o pagamento do IMT e do Imposto Selo, a Declaração de Não divida do condomínio, quando aplicável, e os Direitos de Preferência. Quantos aos prédios Rústicos, além dos documentos instrutórios, são também notificados os confinantes do prédio em causa, para o exercício dos Direitos de preferência.

 

 Vivem-se tempos confusos, que por vezes levam as pessoas a tentar “desenrascar-se” sem recorrerem à ajuda de profissionais conhecedores. Na sua opinião, quais as mais valias e conforto para os cidadãos que a solicitadoria tráz nas áreas onde actua?

O exercício da Solicitadoria é uma profissão regulada, quer pelo Estado, quer pela Ordem dos Solicitadores e Agentes de Execução. Só por si, o facto de ser uma profissão regulada, implica aos cidadãos um nível de confiança nos profissionais de Solicitadoria.

São estes Profissionais que podem praticar os Actos Próprios dos Solicitadores e dos Advogados, previstos na Lei n.º 49/2004, de 24 de Agosto, configurando Crime de Procuradoria Ilícita, quem os praticar, sem que para o efeito esteja habilitado.

Ao cidadão que procurar um/a Solicitador/a, desde logo tem a garantia de ser atendido por profissional qualificado/a para o efeito, que conhece as matérias em análise, que detém acesso às Plataformas necessárias para a elaboração de determinados Actos, que detém o saber necessário para ao aconselhamento e que está legalizado para exercer uma profissão com um alto nível de exigência jurídico, sendo dotado/a de competências para o efeito.

 

É a transparência fundamental em todos os processos?

Nem consigo imaginar um Processo, onde a transparência não seja um dos pilares fundamentais à sua concretização. É a transparência que acalma todas as dúvidas, que possam surgir no decorrer de uma gestão processual imobiliária, que sossega os ânimos e anseios, e que define os bons, dos maus profissionais.

 

O Evaristo é oriundo de uma freguesia do concelho de Beja, onde cresceu com a simplicidade das gentes locais. Considera que essa vivência tem influência na sua forma de estar, de trabalhar e de olhar o próximo?

Sim, certamente que sim. Considero ser na infância, e adolescência que assenta a construção do nosso perfil pessoal, social, e em alguns casos até profissional. Os alicerces de um projeto de vida, assente nos valores de família, no respeito pelos outros, na dedicação às causas, no companheirismo, na amizade, na predisposição para a aprendizagem, no amor às nossas gentes e ao nosso território, na capacidade de compreender a nossa envolvência na comunidade e na necessidade de evolução.

Todos estes valores aqui referidos, não são inatos, são fruto de uma vivência e de opções. São estas opções que tomamos, que nos definem, na forma como somos aceites, e transportamos diariamente quer para o nosso plano familiar, social e profissional. 

 

Ainda falando nas suas origens, o que lhe diz o horizonte? É ele infinito?

Compreendo quem encontra uma certa tranquilidade e conforto, naquilo que já é ou já tem, não aspirando a outros voos, e até rejeitando a aprendizagem.

Compreendo, mas não me revejo nesta tomada de posição. A linha do horizonte, quando o observamos, deixa-nos a perceção de que é finita, mas quando nos deslocamos no seu sentido, e aquela primeira linha que observámos é ultrapassada, visionamos uma outra logo de seguida. É neste conceito que assenta a minha busca por novos horizontes, novas formas de crescimento, valorização pessoal e profissional, numa constante procura pela aprendizagem e solidificação de conhecimentos. “…Ainda há tanto para se aprender, ainda há tanto para caminhar, ainda há tanto o que viver... que às vezes parece que nunca vai chegar. Mas a vida tem dessas coisas, um dia de lutas, outro de vitórias. Quem não passa pelo campo de treinamento da vida não está apto para vivenciar o melhor que ela tem a oferecer….” Letícia Ayala.

 


Alentejo ...porque o horizonte é infinito .... Entrevista Filipe Campêlo

  Falar de Filipe Campêlo é falar de alguém multifacetado, com pensamento desenvolvido e visão estratégica. Quer contar-nos um pouco acerc...