domingo, 1 de março de 2020

Entrevista a Márcio Guerra


Márcio Guerra é um nome que imediatamente relacionamos com empreendedorismo social, inovação e pensamento "fora da caixa".  Profundamente comprometido com causas sociais, é acérrimo defensor dos direitos humanos, e a maior parte da sua actividade tem como base as pessoas e suas condições de vida. Uma entrevista que nos faz pensar e reflectir, e que de alguma forma, inspira algo daquilo que é a obrigação social de todos e cada um de nós, enquanto cidadãos e enquanto empreendedores. Para Márcio Guerra, o Baixo Alentejo também vale a pena! Obrigado por esta conversa tão interessante!


1 - Criar e maximizar valor social é o principal objectivo do empreendedorismo social. Atendendo à realidade da nossa região, que transformações urgentes e prioritárias considera serem passíveis de implementação, numa óptica de interação e simbiose com outras vertentes do empreendedorismo (corporativo e start-ups), no sentido do desenvolvimento sustentável?
Partindo do conceito de que o empreendedor social redesenha relações entre comunidade, governo e setor privado, com base no modelo de parcerias e que o resultado final desejado é sempre a promoção da qualidade de vida social, cultural, económica e ambiental sob a ótica da sustentabilidade dos territórios, eu diria que o empreendedor social pode desempenhar um papel fundamental na criação de um ecossistema com preocupações sociais através da sua relação com empreendedores corporativos e empreendedores de “start – ups” sensibilizando-os para modelos de negócio sustentáveis, amigos do ambiente e do “homem”.
As relações entre comunidade, governo e setor privado não significa que haja uma retirada do estado no que à economia e definição de políticas públicas diz respeito, ou seja a fragilidade das respostas públicas até pode fazer com que a sociedade civil se organize e crie associações com respostas inovadoras, mas a verdade é que deve ser o estado (governo e autarquias) a garantir determinados serviços e investimentos públicos fundamentais para o desenvolvimento das regiões e do país, procurando estimular um espirito empreendedor em que a lógica de parceria múltipla, possa fomentar uma maior participação de empresas privadas, como forma mais reprodutiva de utilizar recursos.
Aliás o pensamento de que menos estado, nos leva a melhor estado e a abordagem da inovação social que aparece sempre em períodos de pós-crise social restringindo-se à procura de respostas para questões sociais novas quando na realidade se vive uma harmonização social no retrocesso e se transporta o conceito de inovação social para noções de subsistência deve-nos alertar para este perigo. O que acontece com a destruição do Estado Social é que se despojam as pessoas dos seus direitos de cidadania num quadro em que são colocadas em situações de carência extrema, e assim a inovação não pode ser senão uma inovação regressiva, construída a partir de bases sociais de desigualdade, injustiça e exclusão. Quando se permite que a sociedade "propositadamente empobreça” e depois se arranja maneira de colmatar essas carências, estão-se a matar as verdadeiras condições para inovar, porque a inovação social que é precisa é a inerente à cidadania social, é a das pessoas portadoras de direitos e responsabilidades e que sejam estimuladas a libertar o seu espirito criativo e empreendedor.
Assim o que é necessário para que haja verdadeiramente inovação e ocorram as transformações na nossa região é a de que esta relação e trabalho em rede resulte em parcerias entre o sector público e privado de forma a ultrapassar em conjunto os vários desafios que temos na nossa região em virtude de um crescimento que nos vai mostrando que, se não se colocar a pessoa no centro da intervenção ao invés da economia, vão surgir desigualdades sociais.
Sabemos que, em muitas situações, há efetiva necessidade de aumentar a produção, de crescer; mas não é qualquer crescimento, nem o crescimento em qualquer parte, ou a qualquer preço, que gera desenvolvimento.
Assim e não descurando o importante impacto que Alqueva teve no Baixo Alentejo particularmente em termos económicos, contudo, o modelo associado ao desenvolvimento do projeto estimulou a concentração da propriedade; aumentou as preocupações ambientais e a destruição do património cultural. Não promoveu o povoamento, não reduziu o desemprego, sendo o trabalho feito com recurso a mão-de-obra barata de imigrantes, e algumas vezes ilegais (só em 2017 foram mais de 10.000 imigrantes nesta situação); e não dinamizou substancialmente as economias locais, a não ser alguma empresa de fornecimento de serviços e equipamentos de regadio.
Este modelo coloca em evidência uma exploração assente num crescimento económico (em que as opções orientam-se para um crescimento elevado do PIB per capita), gerando desigualdades sociais no território ao invés de um desenvolvimento sustentável da nossa região no plano humano, ambiental e social
Assim o que é verdadeiramente necessário é a inovação numa agricultura inclusiva diversificada, amiga do ambiente e do património arqueológico, em que o sector privado da agricultura assuma a sua parte na criação de um modelo económico verdadeiramente orientado para o desenvolvimento regional e para a coesão social e territorial. Que invista na responsabilidade social e através de parcerias públicas e privadas possam criar condições para combater a imigração ilegal e clandestina, apoiando na constituição de gabinetes de atendimento e acompanhamento ao imigrante que possam dar formação a estas pessoas na língua portuguesa, na nossa cultura, direitos e legislação, combatendo desta forma o tráfico e a rede ilegal de mão-de-obra. Que invista em projetos que preservem o património arqueológico e promovam roteiros turísticos para a sua visita e para a observação da apanha da azeitona e da transformação do azeite. Projetos de sensibilização ambiental e de capacitação dos seus colaboradores com vista á implementação de boas práticas.   
O que é verdadeiramente necessário é a inovação num turismo diferenciador, inclusivo e acessível a pessoas com mobilidade reduzida parcial ou total, de acesso a pessoas invisuais ou com problemas de surdez. Se é verdade que em 2017 o Alentejo recebeu a visita de 65. 388 Turistas representando um aumento de 11% comparativamente ao ano de 2016, não é menos verdade de que mais de mil milhões de pessoas no mundo vivem com algum tipo de incapacidade, dos quais cerca de 200 milhões experiencia dificuldades notáveis em termos de funcionamento. Nos próximos anos, a deficiência e a incapacidade serão uma preocupação ainda maior pois a sua prevalência está a aumentar, devido ao envelhecimento da população e ao maior risco de incapacidade na população sénior, bem como ao aumento global das doenças crónicas. Em Portugal, em 2011, aproximadamente 40,5% das pessoas entre os 15 e os 64 anos tinham pelo menos um problema de saúde ou doença prolongados e 17,4% tinham pelo menos uma dificuldade na realização de atividades básicas (INE, 2011).
Para pensar nestas e noutras transformações para o nosso território é necessária a criação de um ecossistema de empreendedores no Baixo Alentejo com preocupações no plano do desenvolvimento sustentável.
Portugal tem hoje um dos mais vibrantes ecossistemas de empreendedorismo da Europa mas será que o Alentejo e o Baixo Alentejo em particular, à sua dimensão pode também entrar num roteiro empreendedor nacional ou internacional, apanhando a “boleia” deste bom momento nacional e ser diferenciador na forma como o dinamiza?
O que temos de fazer ao nível das políticas locais e regionais, das estruturas de apoio, do financiamento, da cultura empreendedora e do capital humano para que tenhamos um ecossistema mais vibrante e humanista? Quais são os principais desafios e que passos devemos dar?
Estas são perguntas e desafios que passam naturalmente por criar um ecossistema de empreendedores. Um movimento social diversificado que congregue paixão, conhecimento, iniciativa, resiliência e transformação, que crie valor e promove a autorrealização do individuo, oferecendo a resposta a muitos problemas societais e/ou supre simplesmente necessidades de mercado.

 2 - Sabemos que são muitos os desafios sociais atualmente existentes. Desafios esses que, na maioria das vezes, encontram espaço em determinadas organizações, cujo eixo de actividade permite o seu trabalho, levando à mudança efetiva. As associações, as organizações e as instituições particulares de solidariedade social são as estruturas mais frequentes. Fale-nos um pouco sobre o papel das associações e da importância de exercer, hoje em dia, o associativismo.
Devemos ter sempre presente de que pela sua própria natureza, o Homem tem necessidade vital de se relacionar com o outro, de criar laços de cooperação e de entreajuda, de desenvolver projetos comunitários, de trocar experiências, de viver e de conviver com as pessoas que vivem junto de si ou nas suas proximidades. Sempre assim foi e sempre assim será
Falar sobre o papel das associações hoje em dia, é termos a consciência de que alguns dos direitos consagrados na Constituição da República emanam deste importante movimento social, uma vez que o mesmo está intimamente ligado às principais transformações sociais, e política, verificadas com o advento do liberalismo, das ideias propagadas pela Revolução Francesa e pelo surgimento da Revolução Industrial.
De forma natural e dado que o Associativismo é uma emanação da sociedade é óbvio que a evolução da mesma “obriga” a ajustamento e ao aparecimento de novas formas, foi o que aconteceu com o 25 de Abril de 1974, pelo que e de acordo com a Confederação Portuguesa das colectividades de cultura, Recreio e Desporto (CPCCRD): “Cerca de metade das associações que hoje temos em Portugal decorrem do 25 de Abril de 1974, a par do substancial aumento do número de associações, mais dois factos se verificaram: as coletividades mais “clássicas” diversificaram em muito as suas atividades e por outro lado, emergiram ou reforçaram-se outros tipos de associativismo: de defesa (património, consumidores, à vítima, etc.); movimento de moradores; juvenil e estudantes; ambiente e ecologia; de pais e da família, pessoa com deficiência etc. Mais tarde, na década de oitenta do século XX: as IPSS (Instituições Particulares de Solidariedade Social) e ADL (Associações de Desenvolvimento Local).”
Se no passado o associativismo teve o seu “berço” na Revolução Industrial, hoje estamos na Era da Informação e do Conhecimento pelo que é fundamental que se coloque este vasto património ao serviço da sociedade atual, dai que a importância de exercer um papel ativo enquanto dirigente associativo é fundamental tanto mais que ainda é nas associações que os jovens de hoje podem exprimir a solidariedade, experimentar novas respostas, agirem como fator de transformação e inovação social ao elaborar e concretizar um projeto comum de carácter coletivo e de raiz social. Valorizarem-se enquanto pessoas através do trabalho voluntário e benévolo como pilar estruturante da economia social, assumindo o exercício da democracia conduzindo a uma efetiva cidadania.  
Em suma participar no associativismo é ter uma vida autenticamente humana, uma vida verdadeiramente feliz.

 3 - Em Beja, que Associações com um papel preponderante a nível social existem, quais as suas missões e as principais dificuldades que enfrentam?
Qual é a percentagem de participação dos jovens nestas entidades e quais são as suas principais preocupações?
No concelho de Beja existem cerca de 300 associações equiparadas a coletividades de cultura, recreio e desporto, instituições particulares de solidariedade social, associações juvenis, estudantis, ambientais e de defesa do património, entre outras denominações, que têm um importante papel na dinamização de um conjunto de iniciativas e projetos nas mais diferentes áreas de atuação, quer ao nível, educacional, cultural, desportivo, social e ambiental.
De uma forma geral a missão passa em primeiro lugar por um importante contributo na prestação de serviços aos seus associados e à comunidade de uma forma geral no acesso à cultura, à atividade física, ao recreio e ocupação dos tempos livres de centenas de crianças. Por outro lado procuram contribuir de forma consensual, para o debate na esfera pública, trazendo contributos para a deliberação de políticas públicas importantes para o nosso concelho. 
Se não há dúvida que este movimento que atua no chamado terceiro sector tem auferido uma maior visibilidade na sociedade portuguesa e no nosso distrito em particular, também não é menos verdade que esse protagonismo (seja junto do Estado, da sociedade civil, ou ainda dos meios de comunicação social) parece recair sobretudo sobre a ação das IPSS’s e de outras Organizações Não Governamentais para o Desenvolvimento (ONGD).
Este fator prende-se pelo facto de vivemos num distrito e num concelho em que a maioria da população é envelhecida e dai que as associações e instituições de cariz social tenham um peso relevante na nossa comunidade. Reflexo desta realidade é o facto de só na Rede Social do Concelho de Beja, estarem representadas mais de uma centena de entidades e associações que trabalham sobretudo neste sector possuindo uma grande importância ao nível da provisão de serviços sociais através do estabelecimento de acordos de gestão e de cooperação com o Instituto da Segurança Social.  
As dificuldades com que este importante movimento social se depara são diversas porque estamos a falar de um movimento associativo que por um lado é composto na sua maioria por trabalhadores por conta de outrem e que após o seu trabalho se dedicam de forma voluntária aos objetivos da sua associação o que nem sempre garante estabilidade na ação, por outro lado estamos perante uma vasta rede de intervenção cívica nas diversas vertentes, em especial nos domínios cultural, desportivo, recreativo e social que presta um verdadeiro serviço público. Muito simplesmente, se não forem as associações a fazer o trabalho que fazem – isto é, a desempenhar as funções sociais que desempenham – quem o fará? E caso esse trabalho não seja feito, que consequências acarretará essa situação em termos sociais?
Assim e pela minha experiência enquanto dirigente associativo apontaria seis (6) grandes preocupações, entre outras que haverá, sobre as dificuldades que este movimento sente:
1 - O necessário e devido reconhecimento por parte do governo e dos poderes públicos da importância social do associativismo nomeadamente quanto às políticas de apoio para a construção de infraestruturas e aquisição de equipamentos. 2 – Não existem mecanismos adequados de incentivo ao dirigismo associativo popular, nomeadamente um Estatuto Social do Dirigente, que alargue o recrutamento e permita a necessária renovação das lideranças nas associações. 3 – Constata-se a falta de oferta de programas de formação adequados às necessidades de qualificação de recursos humanos destas estruturas. 4 – Existe um défice de comunicação das associações com os seus públicos interno (associados, atletas, colaboradores e demais intervenientes internos) e externo (população em geral). 5 – No plano autárquico, faz falta um Gabinete de Apoio ao Movimento Associativo (GAMA) que trabalhe e articule com os dirigentes associativos do concelho, com o IPDJ e outras entidades na definição de uma estratégia de atuação municipal nesta área. 6 – Promoção de uma rede formal, que promova conhecimentos, partilha de experiências e boas práticas deste importante movimento um pouco por todo o concelho e região, que possa em conjunto trabalhar possíveis fundos comunitários com particular enfoque para as questões do empreendedorismo social e da economia social e solidária.  
Sobre a participação dos jovens neste movimento e apesar de Portugal dispor de uma legislação própria que enquadra o movimento associativo juvenil através da Lei n.º 23/2006, de 23 de Junho, estabelecendo o regime jurídico do associativismo, esta participação apresenta assimetrias no quadro da região Alentejo.  
No plano nacional e à data de dezembro de 2017 estavam inscritas em Portugal Continental cerca de 1434 associações no RNAJ, sendo que no distrito de Portalegre este número é de 17 associações juvenis ou equiparadas, no distrito de Évora são 41 associações juvenis ou equiparadas e no distrito de Beja são 6 associações juvenis ou equiparadas.
Os números demonstram que no quadro da legislação em vigor e do RNAJ, o distrito de Beja apresenta um número muito baixo quando comparado com os distritos de Évora e Portalegre, contudo e apesar de não acreditar que os números possam aumentar significativamente, o mesmo não corresponde à realidade do associativismo juvenil, uma vez que muitas associações têm na sua composição jovens, com uma efetiva participação mas que por não cumprirem os critérios do artigo 3.º da lei n.º 23/2006, de 23 de Junho, que estabelece o regime jurídico do associativismo não são consideradas associações juvenis.
Quanto às preocupações dos jovens manifestadas neste movimento eu dividia em dois aspetos. O primeiro tem a ver com o motivo que os leva a formar uma associação, e nesse sentido muitas vezes falamos de questões associadas a gostos pessoais pela dança, cante alentejano, desporto, etc. O segundo aspeto prende-se com a mudança das preocupações e prioridades resultante da sua participação enquanto dirigente associativo ou associado na associação. Nesse plano as preocupações que os levaram a constituir a associação alteram e passam a assumir outras preocupações que se prendem em muitos dos casos com o seu futuro, em ser solidário, a querer participar na vida política da sua comunidade e país, em preservar o ambiente. Começa a haver um despertar de consciência social e cívica com indignação perante injustiças sociais nomeadamente a fome, a pobreza e a exclusão social e a despertá-los para a edificação do bem comum. 

 4 - “Quanto maior for o impacto das medidas, maior será a probabilidade de revolucionar o pensamento social.” Esta premissa pressupõe que para além dos efeitos imediatos, em menor escala, se pretendem resultados de maior dimensão, capazes de proliferar no tempo e no espaço. Considera que o meio onde nos inserimos limita, em parte, a capacidade de reinvenção? Que barreiras deverão ser quebradas e de que forma? Seremos nós mais resistentes à mudança, ou a ideia criada em redor do Alentejo, das suas potencialidades e das suas gentes entranhou-se de tal forma no seio da comunidade das grades zonas urbanas, que nos tornámos insignificantes e desinteressantes aos olhos do próprio país?
Na minha opinião e no que ao empreendedorismo social diz respeito a escala per si não é um valor relevante. Arquimedes disse um dia “Dêem-me um ponto de apoio e eu levanto a Terra”. O que pretendo dizer é que da aprendizagem de um projeto com potencial de empreendedorismo social, como por exemplo o Fit Salvador e os Heróis da Agua do concelho de Beja, a Vida Vale do concelho de Odemira, a Estratégia para o Desenvolvimento e Promoção da Fileira dos Recursos Micológicos no Baixo Alentejo de Mértola ou os Núcleos de Voluntariado de Proximidade da Fundação Eugénio de Almeida de Évora, podemos desenhar outros projetos, evitar erros futuros, replicar o modelo noutras zonas do país ou mesmo fora dele. O que importa é a qualidade, o método, a organização, os processos de trabalho, os resultados junto das pessoas e o impacto que têm na sociedade do ponto de vista social. Depois de tudo isto vem a escala dos projetos.
O progresso do empreendedorismo social em Portugal, nos últimos anos, tem sido de facto muito relevante, com alguns projetos no Alentejo e no distrito Beja particularmente que estão consideradas como iniciativas ES+, que mudaram a vida de muitas pessoas.
Muhammad Yunus, empreendedor social e prémio nobel da Paz dizia que “Todo mundo nasce empreendedor. Alguns tem a chance de libertar essa potencial. Outros nunca vão ter a chance ou nunca souberam que tinham essa capacidade.” Julgo que esta afirmação é o retrato do desafio maior que temos para reinventar o Alentejo, investir no maior ativo de um território, na capacitação das pessoas que aqui habitam para um Alentejo empreendedor.
Do ponto de vista técnico, se ensinarmos as pessoas a serem empreendedores ou o que é o empreendedorismo social, podemos não saber se vamos criar empreendedores mas sabemos que disponibilizámos para as pessoas um conjunto de ferramentas que lhes permite passar dos sonhos para as acções. E isto leva à segunda faceta do empreendedorismo: a pessoal. E esta faceta tem que ver com três ideias chave: a capacidade de questionar, a capacidade de sonhar e a vontade de fazer coisas. A capacidade de questionar leva à análise e ao aparecimento de problemas. A existência de problemas estimula a criatividade e leva ao desenvolvimento de ideias passíveis de se constituírem como soluções para os mesmos. A existência de soluções desencadeia motivação para as implementar.
Assim algumas das barreiras que deverão ser quebradas passam por dar o acesso a estudos e investigações já realizadas, nas mais variadas áreas de atividade, estreitando o percurso para conhecer a realidade do empreendedorismo social em Portugal e na região, de forma a potenciar a criação de soluções no momento certo, no lugar certo, para a pessoa certa. A falta de recursos é uma das principais razões com a qual os empreendedores se deparam, o que leva a um processo mais moroso para o desenvolvimento do empreendedorismo social, impedindo o progresso de determinados projetos, oportunidades de negócio, iniciativas, que podem servir para combater o desemprego, o abandono escolar precoce, o suicídio, a iliteracia, ou a exclusão social de pessoas com deficiência, entre tantos outros problemas.
Outro aspeto vai para além de empenho e dedicação que os empreendedores sociais demonstram, estes precisam de ser escutados, apoiados, para conseguirem atingir os seus objetivos bem como o restrito e complexo sistema de apoios comunitários que inviabiliza oportunidades de negócio, com potencial de sucesso.
Apesar de haver uma certa resistência à mudança da parte das pessoas ainda assim julgo que o peso maior tem a ver com o facto de persistirem algumas debilidades, apesar dos investimentos comunitários. Falo de constrangimentos relacionados com a regressão prolongada da demografia regional, o reduzido dinamismo do tecido empresarial, as limitações acentuadas nos sistemas e redes com potencial para atrair novos fluxos de investimento e a sustentabilidade problemática da mais-valia ambiental que não alavancam o desenvolvimento do potencial que temos e nesse particular os sucessivos governos não têm olhado para o interior de Portugal e para o nosso Alentejo da forma como deveriam olhar, com o respeito e igualdade de oportunidades que permitam re-inventar esta região, de forma a tentar minimizar o flagelo da desertificação que está a abranger todo o Alentejo.

 5 - O objectivo do empreendedorismo social passa por identificar situações de negligência ou desfavorecimento de uma determinada facção da sociedade, construindo caminhos e encontrando soluções para as causas primordiais, ao invés de se tratarem somente os sintomas através dos quais se manifestam essas carências/diferenças. Para isto, o trabalho corporativo em rede é crucial. Reunir “cabeças pensantes” capazes de capitalizar esforços e unir comunidades que se pretendem solidárias com as diferenças socias é, talvez, a base para que se consiga dar à sociedade as ferramentas necessárias para que se trabalhe a mudança.
Se lhe fossem concedidos 5 min de tempo de antena na televisão, que mensagem gostaria que transmitir que elucide com clareza o potencial de desenvolvimento da região, e a importância da conjugação de esforços nesse sentido, por forma a atraír e fixar investimento que traga mais-valias à região?
O Alentejo é uma região atrativa num contexto de afirmação de Portugal como fronteira atlântica da Europa e do "hinterland" ibérico, em particular.
A sua proximidade com Lisboa e com o Algarve, toda a orla marítima e as relações de vizinhança com a Espanha, em particular com a Extremadura e a Andaluzia, colocam o Alentejo numa posição privilegiada em termos empresariais, num quadro de articulação nacional e transnacional.
Somos uma região que conta com cinco selos da UNESCO em vários patrimónios imateriais e materiais e que tem potencialidades por valorizar, desde a junção de terra/mar, existe também uma diversidade de encantos históricos, naturais e gastronomia e vinhos, que fazem desta região única.
Tal como uma página em branco de um livro, nesta imensa planície falta escrever a sua parte, seja construtor da nossa história e invista nos encantos do Alentejo.  

Entrevista publicada na Revista Hall Paxis - Imobinvest 2018 - "Alentejo, Um Território Para Investir"


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