Na área imobiliária a formação em prevenção do branqueamento
de capitais é, para além de obrigatória, bastante útil para o dia-a-dia de um
mediador.
Para um profissional do setor imobiliário, ter formação em
prevenção do branqueamento de capitais é saber identificar riscos e situações
que podem colocar em causa a sua carreira e reputação.
Sabe como identificar uma potencial situação em que a venda
de um imóvel possa ser uma forma de branquear capitais, ou seja, de usar, para
fins legais, dinheiro que foi obtido ilicitamente?
Sabia que, ao permitir esta prática, estará a arriscar a sua
carreira e a reputação da sua empresa?
A formação em Prevenção e Combate ao Branqueamento de
Capitais e ao Financiamento do Terrorismo no âmbito da Mediação Imobiliária é,
além de obrigatória, bastante útil para os profissionais de um setor que, por
envolver transações de montantes elevados, é mais permeável a situações que
podem configurar um crime.
Ricardo Matos Fernandes, advogado e formador nesta área,
explica que a mediação imobiliária está enquadrada numa das atividades que a
Lei 83/2017 considera ser de risco para a prática deste tipo de ilícito. Na
verdade, esta lei é a transposição parcial de diretivas comunitárias e vai ao
encontro da legislação internacional nessa matéria. Muitas dessas leis, por seu
lado, têm como base recomendações do Grupo de Ação Financeira (GAFI), composto
por 35 países e duas entidades.
Esta instituição, após décadas de estudo e investigação
nesta área, estabeleceu padrões internacionais contra o branqueamento de
capitais, que procuram reforçar as obrigações em situações de risco mais
elevado.
Em Portugal, como noutros países, a mediação imobiliária
surge como uma área que requer cuidados especiais.
O sector imobiliário e a formação em prevenção de
branqueamento de capitais
“Se pensarmos naquilo que é a transmissão de um imóvel, a
intervenção organizacional começa justamente com o mediador imobiliário”,
sublinha Ricardo Matos Fernandes, lembrando que o processo – bem como as
obrigações decorrentes da lei – se estendem também a advogados, notários,
solicitadores e conservadores.
“Portanto, faz todo o sentido que quem opera no dia-a-dia
nas transmissões de imóveis tenha formação e conhecimento sobre quais os
deveres que tem de cumprir com vista a evitar ver-se envolvido num processo de
branqueamento de capitais”, explica.
Os conhecimentos adquiridos nesta formação farão com que, no
seu dia-a-dia, os mediadores imobiliários possam estar mais preparados para
“ponderar e adotar comportamentos em função do risco”.
E esse risco implica, por exemplo, permitir, mesmo sem
querer, que dinheiro proveniente da corrupção ou de outras atividades ilícitas
seja utilizado na aquisição de imóveis. Um risco que, na opinião de Ricardo
Matos Fernandes, é maior em empresas imobiliárias de menor dimensão e situadas
fora dos grandes centros urbanos.
“Estas mediadoras são, provavelmente, as que estão neste
momento menos preparadas para que alguém, sabendo que existe aquela imobiliária
que não tem as suas políticas de prevenção de branqueamento de capitais
operacionalizadas, pense que é o melhor local para se iniciar um processo de
branqueamento”, justifica.
Por outro lado, as empresas de mediação imobiliária que têm
muitos clientes internacionais têm, igualmente, um risco acrescido de se verem,
ainda que inadvertidamente, envolvidas neste tipo de processos.
Deveres de informação
Através da formação, é possível perceber quais as situações
que podem indiciar a prática de branqueamento de capitais usando, para o
efeito, uma transação imobiliária.
“Os deveres que constam da lei são deveres que visam, desde logo,
a própria adoção de uma política de atos que previnam de alguma forma o
branqueamento de capitais”, explica o formador.
E que atos são estes? “Vão desde a identificação dos
clientes e de atuar em função do cliente que temos à frente. Por exemplo, ele é
originário de um país de alto risco em termos de branqueamento de capitais? Ou
não?”.
Depois de feita essa avaliação de risco, e de outros
procedimentos e processos com ela relacionados, e de se concluir que existe uma
operação suspeita, é necessário seguir protocolos que passam, por exemplo, pela
comunicação com entidades como o Departamento Central de Investigação e Ação
Penal (DCIAP) ou Unidade de Informação Financeira da Polícia Judiciária.
Ricardo Matos Fernandes reconhece que, “para as pessoas que
não estão habitualmente envolvidas neste tipo de complexidade de processos,
chamá-los a intervir é uma grande alteração no seu dia-a-dia” e que nem sempre
as empresas, pela sua dimensão, estão aptas a lidar com estes procedimentos
complexos.
Por outro lado, “é compreensível que exista alguma
resistência quando se introduz esta pedra na engrenagem para quem está mais
focado na área comercial e em encontrar bons clientes para os bons imóveis que
conseguiu angariar”, reconhece.
No entanto, e enquanto formador e advogado, entende que é
sua missão a sensibilização para adequar os comportamentos aos fatores de risco
relacionados com potencial branqueamento de capitais.
Os riscos
Em Portugal, a criminalização do branqueamento de capitais
começou nos anos 90, com a chamada Lei da Droga. Hoje em dia, “o conjunto de
crimes que dão lugar a dinheiro ilícito e que é considerado branqueamento de
capitais é muito mais vasto”.
Para além da corrupção, tráfico de seres humanos ou
lenocínio, o branqueamento de capitais pode ter origem em situações que, embora
ilegais, já se banalizaram, como vender o imóvel por um preço diferente do que
foi declarado.
“É uma prática que, reconhecidamente, ainda está
incrementada em muitos negócios. Temos que sensibilizar as pessoas que isso é
um crime e que não é só fugir aos impostos. É também um crime de fraude fiscal
e que o dinheiro proveniente desse negócio e a sua integração na atividade
económica constituem um crime de branqueamento de capitais”, revela.
Multas e penas
E, como sempre, o crime não compensa: “A listagem de
comportamentos que constituem contraordenações é muito grande. As sanções que
estão previstas para pessoas coletivas vão de 5.000 euros até um milhão de
euros e para pessoas singulares de 2.500 euros até um milhão de euros.
Portanto, estamos a falar de uma penalização, seja qual for o comportamento”.
E se as multas podem ser dissuasoras, sobretudo para
empresas de menor dimensão, as sanções acessórias são igualmente gravosas,
podendo levar à interdição da atividade.
“A prática dos crimes de corrupção ativa ou passiva ou o
branqueamento de capitais são fatores que podem determinar a perda da
idoneidade, desde que tenham sido praticados nos últimos cinco anos contados a
partir do trânsito da sentença”, lembra Ricardo Matos Fernandes.
A formação em prevenção do branqueamento de capitais é, no
fundo, um alerta “para a necessidade de alterar um conjunto de condutas dentro
de cada organização, de cada mediadora imobiliária”.
A ideia não é, de todo, desconfiar de todos os clientes e
procurar, em cada negócio, uma atitude suspeita, mas sim “adequar os
procedimentos das mediadoras em função dos fatores de risco de branqueamento de
capitais e levar o branqueamento de capitais a sério”.
Além das sanções financeiras e criminais, pactuar com o
branqueamento de capitais tem, também implicações morais e ao nível da
reputação da empresa.
“É óbvio que – e falando na área da mediação imobiliária e
no ramo imobiliário – o objetivo primeiro é fazer negócio. As pessoas têm que
ganhar a vida. Porém, o ganhar a vida tem que ser sustentável e isso implica
que não tenha uma participação numa atividade criminosa. E não podemos esquecer
que, quando facilitamos uma atividade criminosa, estamos a ser coniventes com
ela e o grau de conivência pode levar inclusive à prática do próprio crime”,
revela.
No fundo, combater a utilização de dinheiro ilícito é uma
forma de desincentivar a atividade criminosa: “O propósito é sempre este:
manter o branqueador sentado sobre o dinheiro que obteve ilicitamente sem poder
fazer nada com ele. Esse é o propósito da lei de branqueamento de capitais”,
sintetiza.
Em que consiste a formação em Prevenção e Combate ao
Branqueamento de Capitais
A formação em Prevenção e Combate ao Branqueamento de
Capitais tem a duração de 10 horas e permite que os profissionais deste setor
possam, não só conhecer a legislação referente à Prevenção e Combate ao
Branqueamento de Capitais e ao Financiamento do Terrorismo no âmbito da
Mediação Imobiliária, como os procedimentos a adotar.
Saber o que fazer para detetar eventuais situações de risco
e perceber quais são as declarações obrigatórias, prazos, fiscalização e coimas
são conhecimentos essenciais para quem trabalha nesta área.
Formação obrigatória
Segundo o artigo 11º do Regulamento 276/2019 do IMPIC, os
dirigentes e colaboradores das empresas imobiliárias que exerçam funções
relevantes devem obrigatoriamente frequentar formação nesta área.
Conteúdo inserido na Notícia da Centralimo de 04-03-2020, gentilmente cedida por Paulo Fernandes.
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