De entre os vários sectores que
podem servir de barómetro relativamente ao comportamento da economia, o sector
do imobiliário é sem dúvida determinante para medir o crescimento ou o
desaceleramento económico do país.
Nos últimos anos tem sido o
imobiliário a alavanca da economia, acompanhado das inúmeras actividades
conexas que em seu torno gravitam. A receita gerada com a cobrança de impostos
nas transacções permitiu ao Estado um desafogo financeiro que foi importante na
estabilidade orçamental, tal como as taxas de Iva cobradas nas transacções das
actividades relacionadas.
O país tremeu com a pandemia,
todos ficámos apreensivos. Colocar o pé no acelerador ou não era uma das questões
no momento para muitas pessoas. O sector imobiliário após um ligeiro ajuste,
mais de metodologia, do que de desempenho, continuou em velocidade de cruzeiro
e a par do sector das tecnologias e do retalho alimentar e respectivas cadeias
de distribuição, lá deu novamente o seu precioso contributo numa economia
incerta e onde as interrogações se somavam.
Com a retoma dos sectores de
actividade a nível geral, tudo parecia manter o rumo na autoestrada da
recapitalização das empresas mais afectadas, dos sectores que foram
literalmente impedidos de trabalhar durante dois anos, procurando-se um
equilíbrio social e financeiro que permitisse olhar em frente com alguma
esperança.
Eis que nova barreira surge com o
início de uma guerra indesejada e que atinge um mundo global. Com ela
desencadeia-se uma crise económica, social, energética e política implicando profundamente na vida dos
cidadãos e das empresas.
Todo o tecido social e económico
tem sentido a pressão provocada por uma inflacção galopante, e mais uma vez é o
sector imobiliário a dar nota da desaceleração. Com uma subida de indexantes
nas taxas de juro e com critérios de concessão de crédito e avaliação bancária,
as instituições financeiras recuaram, dificultando bastante o acesso a crédito
habitação para muitas famílias, também elas a braços com um aumento inesperado
do custo de vida, o que faz com que muitas adiem o processo de aquisição de
habitação.
Mas se por um lado as classes
média e média baixa, se enquadram no segmento de mercado daqueles que
necessitam de financiamento para aquisição de habitação, existem outros segmentos
que mantêm a actividade de investimento, compostos por nacionais e
estrangeiros. A uma menor procura nacional, contrapõe-se a oferta para o
mercado internacional, que está a desenvolver projectos que prontamente são
vendidos em planta ou numa fase de construção muito embrionária. Este facto
nota-se sobretudo nos grandes centros urbanos, Lisboa e Porto e respectivas
áreas metropolitanas, continuando a tendência inflacionista de preços nesses
locais, mas que alastra a outros pontos do território nacional.
Estará o imobiliário a duas
velocidades neste momento? Que perspectivas existirão para 2023 e seguintes?
É uma realidade que o mercado
imobiliário neste momento tem duas velocidades distintas, existindo alguma disparidade
entre elas, com uma ligeira tendência de abrandamento e até estagnação nos
territórios do interior do país, no segmento residencial de primeira habitação,
e por outro lado com um crescendo de investimento estrangeiro nas grandes
malhas urbanas, onde as aquisições são feitas na grande maioria com capitais
próprios, permitindo aos promotores um encaixe de receitas mais rápido, que lhes permite reaplicá-las num prazo
também ele mais curto.
As perspectivas de futuro irão
balançar sem dúvida nesta dualidade, pelo menos enquanto se assistir a uma
escalada das taxas de juro e da inflacção. No entanto, convém não esquecer que
o negócio dos Bancos é assente essencialmente nas taxas de juro cobradas nos
empréstimos e nas comissões dos produtos de cross-selling, e uma retracção
significativa na concessão de crédito habitação, poderá originar problemas no
curto/médio prazo, já que a recapitalização das instituições financeiras estava
a ser solidificada no momento de eclosão do conflito entre a Rússia e a
Ucrânia. Por outro lado, existe toda uma componente fiscal, bastante
significativa na última década, proveniente das receitas de IMT e IS, na venda
dos imóveis, que vai deixar de chegar aos cofres do Estado se se mantiver esta
situação de desaceleração, o que vai também contribuír para um menor encaixe
financeiro que tem sido relevante para a aplicação dos dinheiros públicos.
Quero acreditar que algo vai ser
planeado e feito no sentido de tentar corrigir a assimetria existente, pois o
território nacional não se confina às grandes áreas metropolitanas onde o valor
das casas é absolutamente absurdo, impulsionado pelo investimento estrangeiro.
Sendo a habitação um pilar fundamental na vida dos cidadãos e das famílias, é
imperioso que se pense que é necessário “moralizar” o preço dos imóveis para
que seja possível a aquisição ou o arrendamento, sobretudo por parte das
camadas mais jovens, já de si precárias em termos de mercado laboral.
Relativamente ao interior do território, é urgente que se olhe, que se perceba,
que se pense, a realidade e o longo caminho a percorrer no sentido de devolver
vida, iniciativa e condições, para quem permanece, para quem ousa deslocar-se,
ou muito importante também, para atraír novos habitantes e nova massa crítica,
tão essencial ao desenvolvimento e ao crescimento. São necessárias políticas de
habitação e desenvolvimento que não estagnem as localidades, mas que as tornem
polos interessantes para residir e trabalhar.
A caixa de velocidades do
imobiliário vai assim reflectindo as várias realidades nos vários momentos e
nos vários locais …
MHP
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